Artesanado de Palha de milho, da cidade de Redenção da Serra. Artesã Giselda. Fotografia de Reinaldo Meneguim

Cortejo Carnavalesco

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A partir da década de 70, a TV entrou em ascensão com sua busca frenética da imagem de impacto. Com ela entraram também em ascensão os desfiles das escolas de samba do Rio e em seguida São Paulo. E paulatinamente foi-se impondo uma linguagem televisiva, dinâmica, homogeneizada, em que o visual e o conjunto passaram a contar acima de tudo.

É o ritmo de TV, onde os segundos valem dólares e acabam por sacrificar o samba no pé, o passo. Não só ele, mas também, e sobretudo, o lado mais espontâneo da farra carnavalesca. Tudo é planejado e decidido por poucas cabeças e preparado por poucos. Porque deve contar o show, o espetáculo. Não cabe aqui ponderar sobre a validade ou a beleza do mesmo.

Entretanto, paralelamente ao carnaval oficial, com seus desfiles e agremiações organizadas, coexistem com força uma grande quantidade de manifestações carnavalescas que servem de espaço para aqueles que querem brincar o carnaval, de forma mais espontânea. Congregam, via de regra, moradores de uma mesma rua, grupos de amigos, de conhecidos, bem como daqueles que aderem ao cortejo à medida que o desfile passa pelas ruas, com espaço para as improvisações, para a liberdade na forma de se trajar, de dançar e também na estruturação interna dos mesmos.

Estas formas mais espontâneas de divertimentos momescos, que serão aquelas consideradas neste portal, não foram descartadas, nem poderiam sê-lo. São a base de nossas festas coletivas, tendo atravessado séculos, seguramente milênios. É o momento da catarse, da purgação, do extravasamento, da auto-superação, da gozação, da suspensão temporária das regras da “vida normal” do dia-a-dia. O carnaval, festa do povo na rua, feito por todos e para todos,

O carnaval derivou-se de várias festas anuais do mundo pré- cristão, posteriormente cristianizadas pela Igreja. Prevalência dos sentidos, terapia coletiva, como as festas celebradas pelos romanos e demais povos itálicos na antiguidade. Assim eram as saturnálias, que aconteciam no início de janeiro, em honra de Saturno, o deus da agricultura, durante as quais chegavam-se a suspender os negócios públicos e particulares.

A palavra Carnaval se originou de carne + vale – do latim caro, carnis(carne) e vale (adeus), ou por outra, Carnelevare (ou Carnelevamen) com sentido de suspenção da carne, abstenção de carne. Originalmente designava, no antigo calendário da Igreja Católica, um período de liberalidades e comelança farta que preparava os fiéis para a chegada da Quaresma, período consagrado à penitência, ao jejum e à abstinência de carne.

Bonecões/Bois Na Idade Média, as festas eram organizadas por certa parcela do clero em torno das catedrais, pela passagem do Dia de Reis (6 de Janeiro). Sempre acontecia nas ruas e com grande adesão dos cidadãos. Havia desfiles com mascarados e carros alegóricos, aos quais o povo sempre se juntava.

Essa exacerbação dos sentidos e da alegria atingiu seu clímax no século 19, não só nas cidades mas até nas comunidades isoladas. Explosão de vida dionisíaca foi o entrudo (do latim introitus, que quer dizer entrada). Os dias de farra aconteciam na rua e dentro das casas. Havia um prazer enorme em molhar os passantes com inocentes limões de cheiro (pequenos projéteis feitos de cera, na forma da fruta, cheios de água de cheiro), com bisnagas (esguichos manuais) e até mesmo com baldes de água. Quando não, mergulhavam-se as “vítimas” nos chafarizes, lagos ou rios. Jatos d’água eram associados a nuvens de goma (polvilho).

Excessos e violências chegavam a ser cometidos enquanto aconteciam numerosos desfiles de mascarados e travestis (disfarces). Os que não possuíam máscaras saíam de sujos mascarados com roupas improvisadas. Eram sátiras, gozações improvisadas com o que estivesse ao alcance das mãos. E, sobretudo, muitos homens, senhores respeitados na sociedade, vestidos de mulher.

Por fim, a tudo isso agregava-se o impacto da pancadaria (fanfarra, percussão) dos zé pereiras, grupo de homens parrudos que desfilavam ao som de enormes bumbos e a eles a massa respondia zé pereira!, seguidos de mascarados, bichinhos de saias, boizinhos, mulinhas e outros exemplares zoomorfos, com o reforço dos bonecos gigantes e cariás (capetas, diabos).

Sem muito esforço, é possível detectar ainda hoje nas grandes cidades e em lugarejos isolados a sobrevivência dos zé pereiras, dos corsos, dos cordões, elementos atenuados do entrudo e a espontaneidade máxima dos blocos dos sujos. São ofuscados pelo brilho dos grandes desfiles ou preteridos, por razões já citadas, pelos veículos de comunicação de massa, mas nem por isso perderam sua função e sua força.

O calendário das festas carnavalescas acabou sendo distendido nos últimos séculos. Assim é que a suspensão temporária das regras da “vida normal” dilatou-se, tendo início em Janeiro (o Reveillon é o primeiro grito de Carnaval do ano). Intensifica-se às vésperas da quaresma, período em que, antevendo-se as mortificações (jejuns e abstinência de carne), outrora mais respeitados durante o tempo quaresmal, permite-se a exacerbação dos sentidos e da alegria, tolerando-se as transgressões. Não é à toa que se diz no Brasil que a vida normal se recompõe depois do Carnaval.

Hoje, paralelamente aos desfiles do carnaval televisivo, sobrevivem e se disseminam as formas mais espontâneas de divertimentos momescos, aquelas que quase nunca despertam o interesse da mídia. Sobrevivem os blocos de sujos ou Vai quem quer que servem de espaço para aqueles que querem se divertir sem assumir os compromissos onerosos das escolas de samba e blocos organizados. Uma forma simples e natural de sair à rua calcada totalmente nas expressões improvisadas e satíricas, total liberdade na forma de se trajar, de dançar e na estruturação interna dos mesmos. Congregam os moradores de uma mesma rua, grupos de amigos, de conhecidos, e aqueles que aderem ao cortejo à medida que o desfile passa pelas ruas.

Nas cidades litorâneas acontecem os Banhos de Dona Dorotéia, cortejos que depois de circular pelas ruas com muita algazarra, esguichos de água e farinha, termina com todos caindo na água.

Os blocos carnavalescos surgiram também no início deste século. Tiveram de início a intenção de servir de espaço para aqueles que queriam brincar o carnaval sem assumir compromissos onerosos das sociedades organizadas, das corporações, dos blocos organizados, com seus trajes definidos, determinados, e orquestras completas.

Inicialmente congregavam os morados de uma mesma rua, grupos de amigos, de conhecidos, bem como daqueles que aderiam ao cortejo à medida que o desfile passava pelas ruas. Daí derivam os blocos do Vai quem quer.

Nas improvisações havia total liberdade na forma de se trajar, nas formas de dançar e também na estruturação interna dos mesmos.

Aos poucos passou a ser possível distinguir-se os blocos de sujos, que brincavam o carnaval durante o dia – mas não só durante o dia – da forma mais improvisada e satírica. Os blocos de sujo passaram a agregar os foliões que buscavam uma maior liberdade e espontaneidade de expressão. Não haviam fantasias pré determinadas. Nestes predominavam, e predominam ainda, as figuras dos mascarados e a maioria deles, dos blocos de sujo, passaram a manter alguns traços do antigo entrudo.

Ao lado deles surgiram blocos organizados, ultimamente chamados de blocos de enredo. Estes começaram a desfilar com fantasias pré determinadas e com estruturação, algumas das vezes, em alas tendo à frente a figura do porta-estandarte e do baliza (que deu origem ao mestre-sala). É bom notar que muitos destes blocos saíam com instrumentos de sopro, as furiosas, no final do seu desfile sendo que não poucos desfilavam e desfilam, com carros alegóricos.

Entrudos
Limões de cheiros, cabacinhas, bisnagas e siringas
Blocos de Sujos e blocos espontâneos em geral
Banhos de D. Dorotéia
Bonecões, cabeções, bichinhos de saias,….
Zé-Pereiras
“O mundo às avessas” – a quebra da rotina
As inversões
Os disfarces

Saiba mais sobre Carnaval nos Estados
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